Serial Killers: O Vampiro de Niterói

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Serial Killers: O Vampiro de Niterói

Marcelo Costa de Andrade, Zona 33
No início da década de 90, uma série de assassinatos contra meninos de classe baixa do Rio de Janeiro assustou a população fluminense. Na maioria dos casos, crianças do sexo masculino entre 5 e 13 anos apareciam mortas nas mediações da cidade de Niterói. Até que uma de suas vítimas, Altair de Abreu, um menino de 10 anos, conseguiu escapar e identificar o responsável pelos crimes.

Com apenas 23 anos de idade, Marcelo Costa de Andrade confessou ser responsável por estuprar e estrangular 14 meninos. Além disso, o “Vampiro de Niterói”, como ficou conhecido, foi responsável por outros atos de extrema crueldade. Em alguns casos,chegou a esmagar a cabeça das crianças, praticar atos de necrofilia e beber o sangue das vítimas.

Foi num desses cultos transmitidos pela TV que Marcelo ouviu que quando as crianças morrem elas vão para o Céu. Segundo a lógica do assassino, ele não matava adultos, pois poderia os estar mandando para o inferno


Créditos:500px iso
A cidade do Rio de Janeiro sempre foi conhecida pela beleza e por seus atrativos turísticos. Turistas de todas partes do mundo visitam o Rio de Janeiro em busca de diversão e entretenimento. Pela sua fama, o Rio de Janeiro ganhou o status de Cidade Maravilhosa. Copacabana, Ipanema, Cristo Redentor, Pão de Açúcar, Carnaval, são nomes conhecidos em qualquer canto do planeta. Não muito longe de toda essa beleza ficam as favelas cariocas. Áreas degradadas, com moradias precárias, e com milhares de pessoas vivendo em situação de pobreza extrema, misturando-se a bandidos de todos os tipos. Essas pessoas convivem diariamente com prostituição, crimes, assassinatos, estupros, tráfico de drogas e de armas. E nesse caótico cenário estão os meninos de rua.

De famílias paupérrimas, muitos sofriam (e ainda sofrem) abusos dentro de casa, outros não tinham nem o que comer, a única alternativa era ir para as ruas tentar ganhar algum dinheiro vendendo balas, limpando vidros de carros, engraxando sapatos ou, na maioria das vezes, pedindo esmola. Muitos desses meninos ajudavam em grande parte o sustento de suas casas e de seus irmãos mais novos. Hoje em dia, ainda é comum vermos nas ruas pais usando as crianças para conseguir algum dinheiro para alimentar toda família. Parte desses meninos viravam delinquentes e cometiam crimes, mas uma grande parte queria apenas comer. Uma situação que, para a maioria dos habitantes da cidade, era comum.
E é nesse cenário de beleza e caos que algo chamou à atenção de um renomado psiquiatra forense no fim do ano de 1991.


“…todas as vítimas executadas com requintes de crueldade e violência sexual… que o transformou num dos mais horrendos serial killers, os assassinos que cometem crimes em série e que, até agora, os brasileiros só conheciam através de filmes como O Silêncio dos Inocentes. Em perversidade e até em número de vítimas, os assassinatos se equivalem aos do americano Jeffrey Dahmer, o canibal que aterrorizou a cidade de Milwaukee, nos Estados Unidos”.
Revista Veja, 19 de fevereiro de 1992

“Ele é um caso clássico daquilo que os americanos chamam de serial killer, o assassino sequencial que tortura, desmembra, come pedaços ou bebe o sangue de suas vítimas”.
Revista Veja, 26 de fevereiro de 1992

“Os traços fisionômicos e o olhar dele eram muito estranhos, aterrorizador, dava medo”
Carlos Augusto Ponce Leon, investigador de polícia

“Ele tem uma visão infantil, retardada, inadequada dos seus delitos”
Carlos Augusto Ponce Leon, investigador de polícia

"Ele tem uma visão infantil, retardada, inadequada dos seus delitos”.
Dr. Antônio Pedro Bocayuva, psiquiatra forense

Rio de Janeiro, Brasil.

Dezembro de 1991

O Rio de Janeiro vivia uma onda de matança. Só no centro de Niterói (um município conurbado à cidade do Rio de Janeiro) havia uma média de 60 homicídios por mês, uma das maiores taxas do mundo, comparáveis a países africanos em guerra (algo que até hoje não mudou). A maioria dos assassinatos eram de pessoas pobres, ligadas ao tráfico ou ao crime em geral. Porém, alguns dos assassinatos chamaram a atenção de um psiquiatra forense do estado.


Dr. Antonio Pedro Bocayuva. Atual diretor do
Manicômio Judiciário do estado do RJ.
“Alguns desses assassinatos me chamaram à atenção. Eram assassinatos de menores de idade. Eles tinham entre 6 e 13 anos, eram estuprados e mortos violentamente. Todos eram assassinados da mesma forma… Esse tipo de delito acaba se confundindo com a própria história da psiquiatria forense brasileira que iniciou-se com os crimes cometidos pelo serial killer Febrônio Índio do Brasil nos anos 20″.
(Antônio Pedro Bocayuva)

Febrônio Índio do Brasil foi o segundo (documentado) serial killer brasileiro. Completamente louco, seus crimes sexuais chocaram a opinião pública na década de 20. Passou mais de 50 anos internado em um Manicômio Judiciário. Febrônio despertou o interesse de psiquiatras, psicólogos, criminalistas e pesquisadores ao longo das décadas em que viveu. Podemos dizer que a psiquiatria forense no Brasil nasceu com Febrônio Índio do Brasil.
Voltando ao Rio de Janeiro, em 1991, na época, todos os casos de assassinatos eram investigados de forma separada, não havia um sistema de delegacia legal, não havia troca de informações e não havia um banco de dados capaz de fornecer dados primordiais para a elucidação de possíveis homicídios em série. O sistema ainda não era informatizado. Cada caso era tratado e investigado de forma particular. Era praticamente impossível saber se vários daqueles assassinatos ocorridos no Rio de Janeiro, bairros periféricos e cidades conurbadas como Niterói, tinham alguma ligação.
Entretanto, um psiquiatra forense encontrou semelhanças entre o modus operandis de vários crimes ocorridos na cidade do Rio de Janeiro e os assassinatos do serial killer Febrônio Indio do Brasil.


Niterói, Rio de Janeiro.

12 de Dezembro de 1991

Um pescador da cidade de Niterói encontra um corpo de uma criança em uma rede de esgoto perto do bairro de Manilha. Ele chama a polícia imediatamente.
O investigador de homicídios da 76ª Delegacia de Polícia de Niterói, Carlos Augusto Ponce Leon, chega ao local com uma equipe da perícia.

Vítima aparentando ter 6 anos de idade é encontrada em uma tubulação de esgoto em Niterói-Manilha por um pescador.  Reprodução/Discovery Channel

Adentrando ao local, os policiais começam a realização da perícia. A criança não tinha documentos, tinha mais ou menos 1,50 de altura, magra, cabelos castanhos e bastante franzina. Um detalhe chama a atenção dos investigadores: as mãos da criança estavam por dentro do short.
Como o short da criança estava molhado, os investigadores logo chegam à conclusão de que a criança morrera afogada. Ela provavelmente estava dormindo quando a maré subiu. A criança teria aspirado a água salgada do mar e veio a óbito.
Porém, algo estranho e bastante suspeito fez com que os investigadores mudassem de ideia totalmente.
Carlos Augusto Ponce Leon, investigador de homicidios em 1991
Reprodução/Discovery Channel
“Estávamos fazendo uma revista na criança, quando viramos o corpo e tiramos o short, a criança estava com um bolo fecal. Questionei isso muito. Após ter visto isso, comecei a suspeitar até da forma como foi encontrada a criança. Um afogado, geralmente, não estaria com as mãos dentro do short. Isso causou muita estranheza”. Carlos Augusto Ponce Leon.

Com mais perguntas do que respostas, os investigadores, juntamente com a perícia, retiram o corpo do local para ser necropsiado.
Intrigado e desconfiado do modo como a criança foi encontrada, o investigador Carlos Augusto Ponce Leon acompanhou pessoalmente a perícia do corpo da criança no Instituto Médico Legal.

“Quando foi feita a pericia, foi constatado que havia hematomas internos no pescoço da criança, ou seja, ele foi esganado. Seu ânus estava rompido, por isso o bolo fecal. A criança defecou porque não tinha mais controle. Ele tinha sido violentado sexualmente.” Carlos Augusto Ponce Leon.

Os investigadores agora já não tinham um caso de uma criança afogada. Eles tinham um homicídio.


Niterói, Rio de Janeiro, 13 de Dezembro de 1991

A investigação do assassinato do menor estava complicada. Ele não tinha documentos, nenhum familiar procurou a polícia para registrar queixa de desaparecimento e os registros de desaparecimentos feitos não condiziam com as características da criança. A polícia não tinha nada.

Mas a visita de um homem à delegacia deu um novo rumo à investigação.

O psiquiatra forense Dr. Antônio Pedro Bocayuva foi à delegacia e conversou com o delegado e investigadores e deu sua versão sobre os vários assassinatos de menores de idade que estampavam as páginas dos jornais do Rio de Janeiro a meses. Para Bocayuva, os assassinatos tinham um mesmo modus operandi e eram crimes sexuais. Para ele, um só assassino havia cometido esses assassinatos. Camuflado em um contexto social de desordem e caos, um psicopata agia com total impunidade, em outras palavras, havia um serial killer à solta nas ruas do Rio de Janeiro.


14 de Dezembro de 1991

Um comerciante, duas mulheres e uma criança chegam ao 76ª DP de Niterói para reportar um desaparecimento. Quem os atende é o investigador Carlos Augusto Ponce Leon.

O comerciante era um vizinho das duas mulheres (mãe e filha). A mulher se identificou como Zeli de Abreu. O seu filho mais novo, Ivan, de 6 anos, havia desaparecido dias antes e ela estava desesperada atrás do filho. Procurou por várias localidades e não descobriu nenhum rastro do menino.

Na Foto (1992): A empregada doméstica Zeli de Abreu e dois de seus 7 filhos. Créditos:Revista Veja.



Alexandre José Batista, Vizinho de Zeli
Créditos:Discovery Channel (2008)
Zeli era viúva e cuidava sozinha dos filhos. Todos passavam fome e viviam às custas de caridade. Alguns dos filhos de Zeli, ajudavam a mãe pedindo esmolas e vendendo doces nas ruas do Rio do Janeiro.

“Eles saiam para vender doces. Eu falava pra eles terem cuidado. Eles respondiam: ‘Mãe, não acontece nada com a gente não’. Tinha dia que voltava tinha dia que ficava na rua”. Zeli de Abreu


“Eles eram meninos de rua mesmo. Eles não tinham o que comer sabe, desde cedo aprenderam a se virar para sobreviverem. As vezes ficavam 2, 3 dias fora de casa, mas sempre voltavam. Aí um certo dia, o Altair e o mais novo, o Ivan, saíram pra comer e não voltaram”.
Alexandre Batista


O Desaparecimento de Ivan

Segundo Zeli de Abreu, no dia 12 de dezembro de 1991, Altair saiu de casa por volta das 13h. Ele iria comer na casa de um conhecido num bairro próximo:
“Era muito triste, não tínhamos comida em casa. Eu só agradecia quando eles achavam o que comer na rua.” Zeli de Abreu
Altair tinha 10 anos de idade e já estava bastante acostumado com as ruas do Rio. Mas nesse dia em especial, seu irmão mais novo, Ivan, de 6 anos, quis ir junto. A mãe deixou, já que não tinha como alimentar o pequeno Ivan em casa. Mas ela logo se arrependeu, saiu na porta da casa e gritou: “Meu filho não vai não!”

Mas já era tarde. “Naquela hora me deu um remorso, o Ivan era tão pequenininho”.

As horas passavam e os dois meninos não voltavam, amanheceu o dia e nada dos meninos. Zeli estava angustiada, porém, estava acostumada com seus filhos passando dias nas ruas. Mais ou menos as 11h da manhã do dia 13 de dezembro, Altair apareceu em casa. Estava com um corte na cabeça, com a camiseta cheia de sangue e bastante triste. O pequeno Ivan não estava com ele. Zeli perguntou pelo filho mas Altair não disse uma palavra, apenas chorava. Zeli entrou em desespero. Procurou Ivan por todos os lugares e, além da sua dor de mãe, ainda foi ameaçada de demissão por sua patroa por faltar ao serviço. Por orientação do seu vizinho, Alexandre Jose Batista, ela resolveu procurar a polícia para reportar o desaparecimento.

No dia 14 de dezembro, um sábado, Alexandre Jose Batista, Zeli de Abreu, Altair, e uma filha de 15 anos de Zeli foram até o 76ª Delegacia de Niterói.

Durante todo o tempo em que conversaram com o investigador Leon, Altair não disse uma palavra. Sempre com a cabeça pra baixo e uma expressão triste. Mas algo despertou a atenção de Leon.
“Num sábado apareceu um comerciante acompanhando uma criança dizendo que o irmão teria desaparecido. Quando eu vi a criança, percebi que ela tinha uma certa semelhança com a criança que havia sido morta. O garoto que havia sido encontrado na tubulação de esgoto tinha os olhos claros. E esse garoto que chegou na delegacia também. Tinha os olhos verdes, bastante bonitos”.
Carlos Ponce Leon
Foi ai que Leon disse a Zeli que as notícias poderiam não ser boas. Um corpo com as mesmas características de Ivan havia sido encontrado em uma rede de esgoto em Manilha-Niterói. Ela teria que ir até o IML para fazer a identificação do cadáver, pois a criança morta poderia ser Ivan.

Ao ver o corpo, Zeli de Abreu se desesperou. Era mesmo o pequeno Ivan. E nesse momento todos entraram em desespero, inclusive seu irmão, Altair.


A História de Altair

O pequeno Altair, de 10 anos de idade, não sabia que o seu irmão estava morto. E após essa descoberta, ele resolveu contar pelo horror que tinha passado.

Praça do Rink, Niterói.

12 de Dezembro de 1991 Altair e o pequeno Ivan andavam pelas ruas de Niterói quando um homem aproximou-se deles. O homem ofereceu 4 mil cruzeiros (cerca de R$ 3 reais) caso os meninos o ajudassem à acender velas para São Jorge na praia. Inocentes e pobres, eles aceitaram na hora. Seria um bom dinheiro para dar a mãe, pensou Altair. Para um menino que dormia no chão, não tinha nenhum brinquedo e passava fome, aquele dinheiro era uma fortuna.
Os irmãos e o homem pegaram um ônibus e desceram na rodovia Niterói-Manilha. Andaram por 7 quilômetros. O pequeno Ivan se cansou. Seu futuro assassino o pegou e o colocou nos ombros. Ao se aproximarem do Viaduto do Barreto, o homem tentou beijar Altair. O menino assustado saiu correndo. Mas sem dificuldades, o maníaco o pegou. Furioso, ele bateu sua cabeça nas pedras da praia. O sangue espirrou por todos os lados. Tonto, sangrando e paralisado de medo, Altair viu o maníaco beijar, alisar e estuprar o seu irmão. Ao consumar o ato, o homem olhou a criança e o estrangulou.

“O que você está fazendo com meu irmão?”, gritou Altair. “Calma ele só está dormindo”, respondeu o homem.

Altair logo percebeu que só teria chance de sobreviver se fizesse tudo que o homem mandasse. Altair praticou sexo oral e deixou que ele o sodomizasse. O homem ficou horas deitado com Altair, beijando e alisando suas pernas e bumbum. O homem gostou tanto da passividade de Altair e, também, dos seus olhos verdes, que levou o menino para um posto de gasolina onde lavou sua cabeça ensanguentada. Dormiram em um matagal atrás do posto, onde o maníaco satisfazia suas necessidades. No dia seguinte, pegaram a barca e ambos foram para a cidade do Rio de Janeiro.

Como tinha que trabalhar, o homem levou Altair até o seu local de trabalho e, em um momento de descuido do maníaco, Altair conseguiu fugir. Pegou várias caronas até chegar em casa. Lá, com vergonha e receio de que sua mãe te batesse, não contou nada.

A Investigação 

Chocados com o depoimento do pequeno Altair, os investigadores da Polícia de Niterói resolveram montar uma força tarefa. O monstro deveria ser pego imediatamente, e para que isso acontecesse, o pequeno Altair era uma peça fundamental. Como o assassino o havia levado até o seu trabalho, Altair tinha que apenas levar os investigadores até o local. Mas havia um problema: Altair não se lembrava do local. Os investigadores tentaram por dias fazer com que Altair lembrasse do lugar. Por fim, eles decidiram refazer todo o trajeto do criminoso, de Niterói até os bairros no Rio de Janeiro.

18 de Dezembro de 1991

Roman Vieira, ex-agente da polícia
civil do RJ
“Ele não sabia onde era. Nós tivemos que fazer a reconstituição completa, saindo do posto de gasolina, atravessar a baía de Guanabara e pegar o ônibus. E fomos andando por toda cidade, passamos por Botafogo, Flamengo… Ele só tinha a lembrança de um ônibus vermelho. Só que eram vários ônibus vermelhos da empresa. Ai ele disse assim: ‘É um que vai para Copacabana’. Então descartamos algumas linhas. Cada investigador entrou em um e fizemos duas vezes a trajetória e, ao final, chegamos a uma conclusão: Praia de Copacabana”. Roman Vieira

Altair disse que o homem distribuía panfletos em Copacabana. Em dado momento, os panfletos acabaram e eles entraram em um prédio para que o homem pegasse mais. Foi nesse momento que ele conseguiu escapar.

Andando por Copacabana, Altair viu um panfleto no chão e reconheceu: “É esse ai!”, disse ele.  O panfleto era da loja Gê-Jóias que ficava no Edifício Roxy.

“Nós havíamos passado duas vezes na mesma rua, só que o ônibus dava uma volta e tinha que fazer o contorno para pegar a Nossa Senhora de Copacabana. Quando chegamos em Nossa Senhora, em Copacabana, ele viu o edifício em reforma e disse: ‘O homem que me pegou trabalha aqui. É naquele prédio’.”
Roman Vieira, ex-agente da polícia

Na foto: O Edifício Roxy na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, Rio de Janeiro.

Os policiais sentiram-se aliviados. Eles porém, não pensavam em encontrar o suspeito em seu local de trabalho. Como Altair era uma testemunha do assassinato do seu irmão, era muito provável que o assassino fugira por saber que Altair poderia levar os policiais até o seu trabalho. Apesar disso, os policiais estavam confiantes, pois conseguiriam informações sobre o assassino com o dono da loja.
Mas para a surpresa de todos, ao chegarem no andar onde a loja funcionava, Altair parou e apontou o dedo: era o homem que havia matado seu irmão e molestado sexualmente dele. Tranquilo, sentado, comendo uma marmita.

Ao darem voz de prisão ao homem, o suspeito disse:
"Pensei que vocês vinham ontem. Fui eu que matei!"
O suspeito foi identificado como Marcelo Costa de Andrade, 24 anos. Trabalhava como panfleteiro nas ruas de Copacabana.
Marcelo foi levado para a delegacia. Os policiais comunicaram um Juiz sobre a prisão do suspeito. Os investigadores de Niterói queriam um representante do judiciário no interrogatório para assegurar que o suspeito não alegasse posteriormente que foi forçado a dar algum depoimento.
Durante o interrogatório, Marcelo não parava de rir, o que deixou os investigadores bastante nervosos.

“Eu fiz amor com ele… sabe? Amor!”, repetia Marcelo a todo momento.

“Ele explicou tudo o que tinha acontecido. Disse que queria fazer amor com a vítima. Disse que fez aquilo com os garotos porque eles eram lindos, que o Altair tinha os olhos lindos. Os traços fisionômicos e o olhar dele eram muito estranhos, aterrorizador, dava medo. Ele conversava com você e de repente dava uma gargalhada do nada. Ele não tinha emoção, não transmitia emoção. Em nenhum momento ele chorou”.
Carlos Augusto Ponce Leon

A mãe do suspeito, Sônia Xavier Costa, descobriu que ele estava preso e foi para a delegacia. Em seu depoimento, ela disse que Marcelo havia ficado muito agressivo nos últimos meses e evitava que ele tivesse contato com os irmãos menores. A mãe tinha medo dele. “Seu problema é uma risadeira sem sentido”, disse ela.

Em dado momento, ela disse que, certa noite, ele saiu de casa com um facão dizendo que pegaria bananas no mato.

“Não queríamos dar o facão pra ele não porque estávamos com medo. Perguntei pra ele: ‘Você quer levar o facão pra onde essa hora da noite?’ Ele estava muito estranho, ficava rindo sem parar. Quando ele voltou, sua roupa e o facão estavam sujos de sangue, perguntei o que era aquilo e ele disse que tinha matado um porco. Tomei o facão dele e escondi”.
Sônia Xavier

Suspeitando de um outro homicídio, a polícia foi até a casa de Marcelo na tentativa de recuperar o facão. A casa era paupérrima, de chão batido. Lá, os policiais encontraram o facão ainda sujo de sangue, recortes de jornais e revistas homoeróticas.

Na foto: O quarto de Marcelo Costa de Andrade. Na mesa, uma foto da primeira comunhão. Fonte: Revista Veja.

Na foto: As revistas encontradas no quarto de Marcelo Costa de Andrade. Fonte: Revista Veja.

“Ele tinha uma caixa onde ele guardava muitas revistas. Revistas indecentes. Revistas de sexo. Tinha vários shorts que ele dizia que daria de presente para crianças. Ele gostava de dar balas para crianças. Fazer festinha… não dava para desconfiar que ele estava com maldade. Ele ficava rindo, esquisito.”
Sônia Xavier
A partir do depoimento da mãe de Marcelo, os policiais desconfiaram que ele poderia estar envolvido nos assassinatos de várias crianças. Os investigadores começaram então a coletar nas delegacias distritais de Niterói crimes envolvendo crianças de um a dois anos atrás.

“Percebemos que ele era um serial killer. Então nós tínhamos que tratá-lo de maneira diferente, com um certo rigor, mas sem afetar as informações que ele estava fornecendo. Tivemos de usar de habilidades, trazendo confiança pra ele”.
Augusto Ponce Leon

Marcelo Costa de Andrade


A Vida de um Serial Killer

Marcelo Costa de Andrade nasceu na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, em 2 de Janeiro de 1967. Sua mãe, Sônia Xavier Costa, trabalhava como empregada doméstica. Seu pai era balconista de bar. Sua mãe era constantemente espancada pelo pai.
Em 1972, foi morar com os avós maternos na cidade de Sobral, Ceará, depois que seus pais separaram. Seu avô, um homem rude e severo, sempre o castigava.
Marcelo nunca foi uma criança normal. Segundo ele, começou a ver fantasmas e vultos aos seis anos de idade. Não tinha amigos, era isolado e ria do nada. Certa vez, matou sete filhotes de gatos. Na escola, os amigos o chamavam de “retardado” e “burro”. Tinha extrema dificuldade nas aulas e nunca passava de ano. Gostava de assistir Pernalonga e a série Chips.

Em 1977, aos 10 anos, sua mãe o buscou em Sobral e foram morar em São Gonçalo. Foi nessa época que conheceu algumas religiões africanas, por influência do padrasto, um macumbeiro e feiticeiro que, segundo ele, incorporava espíritos e fazia feitiços. Era hostilizado pelo padrasto: “Me batia de cinturão e brigava com minha mãe exigindo que eu fosse embora”.
Mais uma vez sua mãe se separou e Marcelo foi morar com o pai em Magalhães Bastos, no Rio de Janeiro. Dessa vez, era sua madrasta que o hostilizava: “Ela também não me dava de comer e me deixava de castigo”.
Ignorado dentro de casa, ele era motivo de brigas entre o casal. De comportamento estranho, Marcelo era ridicularizado. De tanto sofrer, fugiu de casa aos 10 anos de idade.
Marcelo foi parar na Central do Brasil, onde perdeu a “inocência”. Sozinho, desamparado e passando fome, Marcelo começou a se prostituir por dinheiro, ele tinha 10 anos. Não gostava de se prostituir, mas gostava do dinheiro. Era a única forma que o pobre garoto encontrou para sobreviver.
Pouco tempo depois foi recolhido para a Casa dos Meninos, no subúrbio de Engenho de Dentro. Repetiu duas vezes de ano e não conseguiu concluir a primeira série. “Os colegas me chamavam de retardado mental”, recorda.
Apesar da maldade dos meninos e das surras dos inspetores, ele gostava do lugar porque: “Eu via desenhos do Pica-Pau na televisão, lia gibis do Tio Patinhas e do Mickey, jogava futebol e tinha o que comer e onde dormir.”
Aos 14 anos saiu da casa (eles só aceitavam meninos de 6 a 13 anos). Sem ter para onde ir, foi para a Cinelândia. Segundo ele, foi para lá porque o nome parecia com “Disneylândia”. Passando fome, ele voltou a se prostituir. “Eu fazia isso porque tinha fome e precisava do dinheiro para comer.”
Era sempre o parceiro ativo, mas uma vez, um homem de cerca de 50 anos o obrigou a ser o passivo. A experiência foi traumática: “Pensei até em me matar, me enforcando.”

Uma das paixões de Marcelo era viajar. Gastava o dinheiro ganho com a prostituição viajando. Viajou pelo Brasil inteiro em lotações e pedindo carona nas estradas. Chegou até em Montevidéu no Uruguai, sua vontade era ir até Buenos Aires, mas o dinheiro não deixou.
Em uma de suas viagens conseguiu chegar até a casa dos avós no Ceará, mas encontrou apenas uma tia. Fugiu depois de sofrer vários maus-tratos dela.

No Rio de Janeiro, novamente, foi recolhido pela Funabem (Fundação Nacional do Bem Estar do Menor), onde já tivera outras vezes. Não gostava de lá, pois segundo ele “dava muito pivete barra pesada”. Ele explicou que tinha família e seus pais foram chamados à instituição. Não quiseram levá-lo para casa. Dois meses depois, fugiu da Funabem e continuou a se prostituir.
Aos 16 anos foi morar com um porteiro homossexual chamado Antônio Batista Freire. Nessa época Marcelo começou a frequentar os cultos da Igreja Universal do Reino de Deus depois de ver um bispo pregar pela TV.
“O Batista me levava ao cinema para ver E o Vento Levou e a Lagoa Azul, e depois comíamos sanduíche no McDonald’s. Foi na casa dele que vi pela primeira vez o programa da Igreja do Reino de Deus na televisão.”
Batista lhe dava roupas e dinheiro, mas o jovem continuava a se prostituir e desaparecia por longos períodos. Era a época em que viajava.
Depois de se separar do porteiro, voltou a viver com a mãe e os irmãos, Paulo, Cristina e Sidney. Foi vendedor de bolsas até se estabelecer como distribuidor de folhetos de propaganda, ganhando salário mínimo. Era uma vida normal, não se prostituía mais, tinha carteira de trabalho assinada e ajudava a mãe. Dava dinheiro para ela passar o fim de semana e ajudava os vizinhos.
Além de leituras, gostava de ouvir discos da Xuxa e do grupo Balão Mágico, uma mente infantil. Com o dinheiro que economizava, fazia pequenas viagens. Mantinha também algumas esquisitices, como da vez em que gravou o choro do irmão mais novo e ficava escutando a fita por longos períodos. Sua mãe achava que ele devia se casar, mas Marcelo respondia dizendo que “as mulheres são criaturas do demônio.”

A Investigação Continua

Não foi difícil fazer com que Marcelo Costa de Andrade confessasse todos os seus crimes.
“Quando pegamos o facão e ele viu que estava sujo de sangue, ele contou tudo.”
Roman Vieira
O serial killer confessou tudo com riquezas de detalhes, e seus crimes, assim como sua frieza, chocou a todos os investigadores.
“Ele relatava seus crimes de uma maneira muito específica. Frieza completa, insensibilidade completa. Ele falava como matava uma criança, esmagando seu crânio, e etc, como se tivesse relatando um fato normal da vida. Ele sabe que está matando uma pessoa e que isso é um crime, mas isso não sensibiliza nele nenhum sentimento em especial”.
Dr. Miguel Chalub


Depoimentos de Marcelo Costa de Andrade

A Primeira Vítima

“Peguei ele a força e fiz sexo com ele. Matei ele enforcado com a própria camisa dele. Uns dois meses depois voltei no local e ele ainda tava lá. Tirei a bermuda dele e os dentes. Voltei lá umas duas vezes, na terceira ele já não estava mais lá.”

A Segunda Vítima

“Vi que ele era bonito, tinha uma bermuda bonita, tinha o bumbum bonito… levei ele pro túnel e penetrei nele várias vezes, gozei dentro… beijei a boca dele… ai depois matei ele enforcado.”

A Terceira Vítima

“Beijei a boca dele tudo… deixei ele dormir. Tinha uma pedra grande lá e eu esmaguei a cabeça dele… sangrou muito… peguei minha vasilha que levava marmita e deixei o sangue escorrer dentro. Bebi o sangue todo… depois coloquei meu pênis nele de novo e gozei.”

A Quarta Vítima

“…eu queria ver a bunda dele e tudo, mas antes de me agarrar nas nádegas dele, aí como já tava sentindo um sadismo muito forte já, aí bati várias vezes com a mão no rosto dele, né… Aí ficou todo deformado, né. Aí depois eu penetrei meu pênis na bunda dele.. bati com uma pedra na cabeça dele… deixei o sangue dele escorrer na vasilha aí eu bebi o sangue dele todo.”

A Quinta Vítima

“Ele era todo bonito, parecia até uma menina… enfiei uma chave de fenda na barriga dele… tirei a bermuda dele, lambi as pernas, o bumbum dele todo… beijei a boca dele, chupei a boca dele tudo… enfiei meu pênis no bumbum dele e gozei tudo… peguei uma pedra grande e soltei na cabeça dele… bebi todo o sangue dele.”

A Sexta Vítima

“…ele ficou com medo de mim, né. Aí eu penetrei dentro da bunda dele, né, meu pênis, aí gozei dentro dele… com esse eu passei a noite toda… esse eu não bebi o sangue não, não tinha nada por perto pra fazer eu sangrar ele, né.”

A Sétima Vítima

“…eu chamei ele porque vi que ele era todo bonito, né… Ele até gritou no começo. Saiu até um pouco de sangue e tudo, no começo, né… Depois eu comecei a beijar a boca dele e tudo. Cheirar o cabelo dele e tudo também. Aí depois de duas horas eu meti na bunda dele, pra gozar de novo.. Aí me satisfiz, aí eu tirei a camisa dele e enforquei com a camisa dele, e esse morreu logo.”

A Oitava Vítima

“…As pernas bonitas, lisinhas e tudo, de bermuda e tudo, rosto bonito… abaixei a cabeça dele no concreto… aí já começou a sangrar muito a cabeça dele. Aí botei a vasilha pra escorrer o sangue dentro da vasilha e aí bebi o sangue dele… Aí penetrei meu pênis dentro das nádegas dele… aí depois de algum tempo eu gozei dentro dele, nas nádegas dele, né. Aí ele nem gritou, que ele já tava fraco já, né? Aí resolvi, matei ele enforcado… com a camisa dele mesmo.”

A Nona Vítima

“Agarrei ele a força, beijei o corpo dele tudo, penetrei meu pênis na bunda dele e gozei muito… fiz umas três vezes assim… enforquei ele com a camiseta dele… ele estava morto mas era muito bonito aí eu beijei ele e fiz tudo de novo”.

A Décima Vítima

“…aí eu deixei uma pedra grande cair em cima da cabeça dele… aí eu deixei o sangue dele cair dentro da vasilha que eu levava comigo pro trabalho, né, aí eu bebi o sangue dele todo”.

A Décima Primeira Vítima

“…não deu pra penetrar meu pênis nele, que ele era muito novo, né? Aí penetrei nas coxas dele, né. Aí gozei nas coxas dele. Aí tinha um riacho, uma lagoa pequena ali, né, que enche de água de chuva, né. Aí matei ele afogado lá, aí deixei lá ele morto lá”.

A Décima Segunda Vítima: Ivan

“Matei o pequeno enforcado… eu queria o Altair que era maior. Não fiz nada com o menorzinho. Ai beijei a boca do Altair, fiz sexo com ele… Fomos pro posto de gasolina e dormimos, quando amanheceu o dia namorei com ele de novo, toquei uma punheta olhando pro rosto dele, gozei no rosto dele todo… não matei ele não, deixei ele pra fazer mais de noite, matar de noite. Fui para o trabalho e ele fugiu.”


Marcelo Costa de Andrade narrou um a um os 14 assassinatos que cometeu. Enquanto as investigações avançavam, os investigadores descobriam que o “Vampiro de Niterói” deixou um rastro de mortes além dos limites do estado do Rio de Janeiro.

Na foto: Em uma das imagens, Marcelo mostra à polícia como esmagou a cabeça de uma de suas vítimas com uma pedra.


14 de Fevereiro de 1992

Nesse dia, Marcelo leva os investigadores até o Morro Agudo em Nova Iguaçu, Senador Camará. Lá os investigadores encontram o esqueleto de uma de suas vítimas.

Na Foto: Marcelo Costa de Andrade ao lado do esqueleto de uma de suas vítimas. Fonte: Revista Veja.

“Ao lado desse esqueleto tinha leite e resíduos de pão. Nós perguntamos porque ele havia trazido aqueles alimentos. Ele respondeu que era para alimentar a criança. Mas eu questionei: ‘Mas ela já estava morta Marcelo? Ele respondeu: ‘Mas o seu espírito não’. Então perguntei: ‘O que você fazia com o esqueleto?’ Ele respondeu: ‘Ah, eu pegava a mão do esqueleto e me masturbava. Com a outra mão do esqueleto eu me arranhava’. Ele não tinha sentimento, a ação dele era só sexual, satisfazer suas necessidades, como um animal.”
Augusto Ponce Leon

Na foto: Ao ver o esqueleto, Marcelo pega a bermuda da vítima e começa a esfregar as mãos como se estivesse revivendo o seu assassinato.

A Tentativa de Fuga

Marcelo confessou aos investigadores que matou uma criança em Belo Horizonte, Minas Gerais. Em fevereiro de 1992 ele foi entregue à polícia mineira. Alguns investigadores de Niterói o acompanharam. Eles foram até o alto de uma pedreira onde ele disse que havia cometido o crime. Os investigadores percorreram todo o local mas não encontraram nenhum vestígio do corpo. É provável que Marcelo tenha enganado e pensado que o garoto havia morrido. Mas o mais provável é que o corpo e os ossos tenham sido triturados com a brita. Havia passado quase um ano do fato e dificilmente eles encontrariam algum vestígio naquele lugar.
E foi nessa pedreira que Marcelo tentou fugir, pulando vários degraus da mesma.
“Ele tentou fugir mesmo, na frente de todo mundo. Nossos policias juntamente com os policiais de Minas Gerais conseguiram conter a sua fuga.”
Augusto Ponce Leon
Em seis meses, os 14 assassinatos de Marcelo haviam sido elucidados.


O Laudo

Parecia certo que Marcelo era um doente mental. A dúvida era saber se ele poderia ser responsabilizado criminalmente pelos crimes que cometeu. Em março de 1992, Marcelo foi internado no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Heitor Carrilho, no Rio de Janeiro, para submeter-se a um exame de sanidade. Sua família foi exaustivamente entrevistada e os peritos do hospital passaram 45 dias observando seu comportamento. Se fosse considerado inimputável, trocaria a prisão por um hospital psiquiátrico.
“Essa vida marginal, sem valores, ligado apenas à sobrevivência pessoal… preocupado apenas com o que que eu vou comer amanhã, onde vou dormir… isso leva uma pessoa a ter esse tipo de conduta, muito desviada da norma social. Se você associar uma conduta antissocial a uma conduta psicopática, aí realmente passa ser um retardo mental com aspectos psicopáticos. Eu coloquei no laudo que ele era parcialmente responsável. Mas o juiz não aceitou, considerou que ele era irresponsável e portanto não aplicou pena nenhuma nele. Mandou ele ficar internado até sua recuperação.”
Dr. Miguel Chalub, psiquiatra forense
Marcelo Costa de Andrade foi considerado inimputável perante às leis brasileiras. Não foi julgado por nenhum dos seus crimes. Sua pena foi a internação em um Hospital Psiquiátrico por tempo indeterminado. De três em três anos, passaria por novos exames, podendo ganhar a liberdade caso algum laudo concluísse estar curado.
Na época houve uma certa controvérsia sobre essa decisão. Na mesma época em que Marcelo era considerado inimputável, um outro serial killer era considerado culpado pelos seus crimes. O canibal americano, Jeffrey Dahmer, cometeu crimes tão terríveis, (ou até mais) quanto os de Marcelo, porém, ao contrário de Marcelo, Dahmer foi considerado são e mandado para uma penitenciária nos Estados Unidos. A comparação entre os dois casos, na época, foi imediata.

Modus Operandi

“O Vampiro de Niterói” escolhia as suas vítimas de acordo com a idade. Elas deviam ter entre 6 e 13 anos. Marcelo sempre perguntava a idade dos garotos. Para ele, garotos mais novos eram mais bonitos. “Eu preferia meninos pequenos porque eles eram mais bonitos, tinham a pele macia”, conta.
Não fazia distinção de raça e escolhia sempre os mais pobres. “Os garotos de classe média não aceitavam os meus convites”.

Marcelo enganava suas vítimas contando sempre a mesma história. Oferecia dinheiro caso os garotos o acompanhasse para ajudá-lo a acender velas para São Jorge. Quando não funcionava, ele pagava um lanche ou comprava um refrigerante para a criança. Levava as vítimas para locais desertos como praias, morros e galerias de esgoto (Marcelo matou muitos em galerias e túneis abaixo da BR-101).

O Ritual

Chegando ao local, longe das vistas das pessoas, o calmo e gentil Marcelo se transformava. Começava beijando a boca da vítima e caso ela resistisse, era espancada. Alguns ficavam paralisados com as investidas do serial killer e não reagiam. O vampiro beijava todo o corpo da criança, alisava suas pernas, seu bumbum, obrigava a criança a fazer sexo oral. Estuprava e ejaculava no bumbum, rosto e dentro da boca das vítimas. Repetia o processo quantas vezes fosse necessário. Ao satisfazer suas necessidades, Marcelo estrangulava suas vítimas com suas camisetas. Algumas vítimas tiveram as cabeças esmagadas com pedras. Ele virava as vítimas de cabeça para baixo para que o sangue escorresse mais rápido. Enchia sua vasilha de marmita de sangue e então bebia todo o sangue da criança. Chegava a esfregar o sangue no rosto e braços.
Marcelo sempre voltava nos locais dos crimes para visitar os cadáveres. Masturbava olhando para o rosto das vítimas e levava as bermudas como troféus.


Análise Psicológica

Na foto: Marcelo Costa de Andrade foi capa da revista Veja em 24 de fevereiro de 1992. Fonte: Revista Veja.

Psiquiatras que examinaram Marcelo Costa de Andrade o diagnosticaram com traços psicopáticos de personalidade (provavelmente devido à sua infância sofrida). Foi diagnosticado ainda como doente mental grave, com esquizofrenia e psicopatia, portador de personalidade antissocial e inteligência baixa.

As Vítimas de 6 a 13 anos …

Nos 8 meses em que Marcelo se dedicou à matança, todas suas vítimas eram meninos de 6 a 13 anos, coincidentemente a mesma idade dos meninos internos da Casa dos Meninos, lugar onde Marcelo passou alguns anos. Coincidência? Vingança contra os garotos que o infernizaram no internato? Desejo de impedir que os meninos crescessem e sofressem como ele?
Ele foi visto várias vezes rondando a Casa dos Meninos:
“Fiquei pensando que gostaria de voltar a ser menino, tive saudade e ia passear lá perto”, disse ele na época.
Pelo menos num dos crimes, há um claro indício de vingança contra seus ex-colegas. Em junho de 1991, Marcelo desceu do ônibus, na estrada rio-manilha, e viu Odair José Munis dos Santos, 11 anos, pedindo esmola. O serial killer o convidou para ir até a casa de uma tia para pegar três mil cruzeiros e dar-lhe de presente. É claro que não havia tia alguma, Marcelo o levou até um escruto campo de futebol.
“Tentei tirar o short dele, mas como o Odair resistiu, tive de esganá-lo. Não reparei se ele estava vivo ou morto quando o estuprei. Não consegui me satisfazer. Apertei mais uma vez sua garganta para garantir que a alma dele fosse para o céu”, disse Marcelo.
Ele voltou para casa, se masturbou pensando no menino morto e em seguida jantou arroz, feijão e fígado de galinha. Às 11 horas da noite, pediu um facão para a mãe, dizendo que ia cortar bananas nas redondezas.
“Voltei ao campo de futebol e serrei a cabeça do Odair para que as crianças debochassem dele quando chegasse no céu, assim como meus colegas implicavam comigo”.
Na foto: Odair José Munis dos Santos. Fonte: Revista Veja.


Os Risos…

“Então, os risos imotivados dele são próprios, digamos, de uma puerilidade, de uma infantilidade, de uma mente fantasiosa que ri de supostas imagens, pensamentos que lhe vem a cabeça com frequência. Acho que são compatíveis com sua incapacidade de compreender totalmente o caráter do delito. Portanto ele tem uma visão infantil, retardada, inadequada dos seus delitos”.
Dr. Antônio Pedro Bocayuva

O Vampirismo e a Religiosidade…

“É comum em pessoas portadoras de aspectos psicopáticos de personalidade o canibalismo, a necrofilia e o vampirismo. Por que a pessoa produz esse tipo de atitude? Eu acho que aí é que está contida a verdadeira e,  talvez, o máximo da bestialidade”.
Dr. Antônio Pedro Bocayuva

“Eu bebia o sangue deles para ficar jovem e bonito como eles”, dizia Marcelo.

Para o psicólogo americano Joel Norris, isso é uma prática bastante comum entre os assassinos em série.
Joel Norris, que já entrevistou mais de 30 assassinos em série e pesquisou a vida de outros 100, enumera algumas experiências que se repetem nos casos de criminosos dessa espécie. Muitos foram molestados sexualmente durante a infância e o que os excita é o processo inteiro de encontrar a caça, conquistá-la e capturá-la. Um terço deles costuma se apossar de porções da vítima através do canibalismo, vampirismo, ou prática de necrofilia. Dez por cento deles são homossexuais e atacam pessoas do mesmo sexo. Os serial killers também padecem de um sintoma denominado hiper-religiosidade.

“Eles aderem a alguma ideia, que pode ser o cristianismo, o satanismo, o racismo ou outros, que funciona como uma justificativa para os assassinatos, ou seja, eles acreditam que estão fazendo um favor à vítima ou purificando a sociedade”, diz Norris. Era o caso de Marcelo.

Evangélico aplicado, Marcelo passava horas lendo revistas evangélicas e livros do bispo Edir Macedo em seu quarto. Marcelo frequentou a Igreja Universal do Reino de Deus por nove anos. Ele ia aos cultos várias vezes por semana, acompanhando as orações e ritos das 6 às 10 horas da noite. O assassino lembra que em 1989 o pastor Eliezes de Ávila ensinou que todas  as crianças quando morrem vão para o céu. Ele ainda não havia começado sua sequência de atrocidades, mas o ensinamento do pastor calou fundo na sua mente. Ele nunca tentou matar adultos porque, se fossem pecadores, poderia “estar mandando eles para o inferno”. Na época, em uma entrevista para a revista Veja, o pastor Eliezer de Ávila disse que Marcelo entendera erroneamente a sua pregação.

“O que eu sempre lembro nos meus cultos é que Jesus pregava: ‘Deixai vir a mim os pequeninos porque deles é o reino dos céus'”, disse ele.

O criminologista Erik Hickely, da Universidade da Califórnia em Fresno, diz que o caso de Marcelo se parece muito com o de Clifford Olson, um canadense que matou onze crianças no início dos anos 80.
“Olson também dizia que matava as crianças para que elas ficassem logo perto de Deus e para evitar que elas sofressem como ele sofreu”, diz o criminologista, autor de “Os Serial Killers e suas Vítimas”. “Mas na realidade ele não queria que suas vítimas tivessem uma infância melhor que a sua, que foi molestado quando criança”.

Sua compulsão em falar dos crimes…

Para o psicólogo americano Joel Norris, autor de “Serial Killers: A Ameaça Crescente”, a compulsão em falar sobre os crimes é uma característica desse tipo de psicopata. Eles tem a necessidade de confessar: “As confissões torrenciais dos serial killers mostram que, de certa forma, eles queriam ser presos, pois só assim poderiam falar dos problemas que os afligiam”.
E isso pode ser comprovado por uma fala de Marcelo em um de seus depoimentos: “Eu não queria fugir, eu queria tirar da minha cabeça essas ideias de transar com garotos.”


Ele poderá sair da prisão?

Para o diretor do Hospital Psiquiatrico Henrique Roxo (onde Marcelo está atualmente), Dr. José Pascotto, ainda não há condições de liberar Marcelo sob nenhuma hipótese: “seu transtorno é tão grave que, mesmo idoso, pode continuar a cometer delitos”.
“Teoricamente SIM. Ele poderá deixar o hospital. Mas nós temos que ter garantias. Há uma certa segurança, uma certeza absoluta de que ele não irá cometer mais crimes.”
Dr. Miguel Chalub, psiquiatra forense

A Fuga Do Vampiro

24 de Janeiro de 1997


Na Foto (1992): Sônia Xavier da Costa, mãe de Marcelo. Fonte: Revista Veja.

“Era umas 6h da manhã e a polícia estava na minha porta, tudo armado. Fiquei morrendo de medo, não tinha feito nada de mal. A polícia chegou dizendo: ‘Cadê seu filho?’ Eu disse: ‘Não sei não’. Ai eles falaram: ‘Ele fugiu’. Fiquei com medo dele começar a fazer tudo de novo. Colocaram no anuncio que davam dois mil reais para quem achasse ele”.

Na foto: A Fuga do Vampiro. Marcelo Costa de Andrade fugiu do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Heitor Carrilho, no Rio de Janeiro, em 24 de janeiro de 1997. Uma recompensa de R$ 2 mil reais foi oferecida pelo estado para quem desse informações sobre o seu paradeiro.

Durante um banho de sol, Marcelo aproveitou a distração dos guardas e fugiu por um portão.

Marcelo foi para a casa do seu pai, no Ceará. Ao chegar lá, ficou perambulando pelas ruas. Foi reconhecido por uma familiar e denunciado para polícia. Foi recapturado dias depois.

“Ele não deu nenhuma explicação porque foi para o Ceará, na nossa interpretação ele achou que lá poderia encontrar uma proteção do pai. Mas ele estava errado porque o pai mal quer saber dele.”
Dr. Miguel Chalub, psiquiatra forense

A Morte de Altair

O pequeno Altair de 10 anos viu seu irmão ser estuprado e morto. Sobreviveu a uma morte certa nas mãos do Vampiro de Niterói. Mas a trágica experiência marcou sua vida para sempre. Segundo sua mãe, ele nunca mais foi o mesmo. Sempre lembrava do episódio, ficava cabisbaixo e triste. Tempos depois ficou muito doente e foi internado. Altair morreu pouco tempo depois de leucemia.

Os Anos no Hospital

Marcelo encontra-se preso. Sua mãe o visita regularmente no Hospital Psiquiátrico: “Amo ele, é o meu primeiro filho. Quando chego lá e não me deixam ver ele é muito triste.”
Suas risadas continuam: “Ele não era normal, ele ria muito. E até hoje quando eu vou lá, ele dá aquelas gargalhadas de perturbado mesmo.”
Seu pai visitou ele apenas quatro vezes durante todo esse tempo.
No início de sua internação, Marcelo causou muitos problemas: abaixava por trás e tirava a calça de internos, batia em outros, empurrava quem ficasse na sua frente, sempre estava metido em confusões. Depois de ficar um tempo internado isoladamente, passou a valorizar a liberdade de andar pelo hospital. Passou 10 anos tomando medicação intensa e hoje vive sem remédios. Fala com coerência, tem limites e disciplina. Poderia até ser solto, porém, como o próprio diretor do Hospital psiquiátrico diz:
“…ele está estabilizado porque tem acompanhamento 24 horas por dia. Se sair, certamente não terá nenhum tipo de condição social, familiar ou estrutura que permita um acompanhamento, e é ai que poderá desequilibrar-se e voltar a cometer crimes… e, além do mais, será difícil encontrar um profissional, em sã consciência, que dê um laudo favorável à saída de Marcelo Costa de Andrade.”




Fonte(s)  Matéria reproduzida de O Aprendiz Verde. Outras fontes incluem 78 vítimas e Wikipedia.
Imagem de capa  Marcelo Costa de Andrade, reprodução/wikipedia

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